29 julho, 2012

Rumo ao norte

Olá a todos (ou seja, ninguém). Estou experimentando uma mudança de país (as palavras inusitadas foram usadas de propósito) hoje. Começarei a postar majoritariamente em inglês em vez de em português, eventualmente traduzindo de volta (mas não se fie nisso). Este deixará de ser meu blog oficial. Você pode começar a ler meus novos posts (em inglês) em Refraction in Drops. [Eu mudei artificialmente a data de postagem.]

06 julho, 2012

ateísmo e musicalidade

O paradigma da minha posição sobre a ideia de que a musicalidade é melhor assimilada em crianças é parecida com o da minha posição sobre existência de fenômenos sobrenaturais (deuses, em particular). São ideias e questões cuja resposta desconheço. Como muitas vezes já alardeei (para pessoas que tem dificuldade de entender tal sutileza), meu ateísmo, por exemplo, não é propositivo; é mais a forma de encarar a vida: vivo como se não houvessem deuses. O mesmo para a musicalidade. Não sei se crianças se desenvolvem musicalmente mais facilmente, nem quanto há de genético no talento musical; simplesmente tento melhorar minha técnica musical (no por ora meu único instrumento, o violino) o máximo possível.

04 junho, 2012

O solipsismo e o trote do Diabo

O solipsismo é a ideia de que todas as coisas são somente sensações na minha mente, a única coisa que existe de verdade. Se me permitem, vou chamar isso de hipótese. A hipótese do solipsismo se confunde totalmente com a hipótese de que as coisas existem de verdade, não podendo ser refutada. Um universo no qual o solipsismo fosse verdade se comporta da mesma maneira que um universo no qual os objetos exteriores à mente existem de verdade. Temos duas hipóteses que descrevem, de maneira muito diferente, o mundo. Como devemos proceder para dizer qual delas é verdadeira, se é que alguma é? Com perguntas como essa, percebemos como é difícil dizer o que é verdade. Não deve existir uma verdade absoluta no universo; o que há são modelos (ou hipóteses) que se aproximam do que o universo parece ser. O que ele é mesmo, se as bananas são reais ou imaginárias em essência, está além de qualquer experimentação. Desse modo, não dá pra dizer se o solipsismo é falso ou verdadeiro, não com as propriedades que gostaríamos que os conceitos "falso" e "verdadeiro" encerrassem. Vejo duas decisões racionais a serem tomadas. A primeira é rejeitar uma das hipóteses, e trabalhar com a mais palpável para produção de mais conhecimento; no caso, que os objetos são reais mesmo. A segunda é pensar que as duas são descrições equivalentes de uma mesma realidade. Nesse caso, não podemos descartar uma ou outra. Quem conhece matemática suficiente pode pensar em duas funções dos reais nos reais que coincidem em todos os pontos exceto num conjunto de medida nula. Apesar de serem duas funções diferentes, podemos dizer que elas são equivalentes (em um certo contexto de equivalência; um possível seria L^2). Apesar de uma função em L^2 não ter um valor definido em cada ponto (já que esse tem medida nula), podemos trabalhar com alguns aspectos invariantes para funções equivalentes; por exemplo, a integral, na reta, do seu quadrado. Na linguagem das classes de equivalência, a primeira decisão seria tomar um representante da classe; a segunda decisão seria trabalhar com toda a classe de equivalência. Retornando do tijolaço, apesar de eu citar duas decisões procedimentais, não recomendo uma nem outra, tanto para o problema metafísico como para o matemático. Somente é importante tê-las em mente, saber como poderíamos tratar problemas assim. Existe uma hipótese bem famosa, defendida por pessoas no mundo inteiro mas com muitas variações, que é a hipótese de que existe um ser (doravante chamado Deus)que agiu como descrito em Bíblia Sagrada (vários autores), que tem certas regras e espera que os humanos as sigam. Dependendo do grau em que eles a seguirem, indivíduos são salvos da danação eterna em uma cidade cercada por um muro quadrado que tem três portas em cada ponto cardeal. (Confira no sublivro Apocalipse, capítulo 21.) Há também uma questão menor que é a do nome dos salvos previamente escrita num certo livro da vida, o que nos sugere uma versão fatalista do mundo (a pessoa não consegue escolher suas ações a ponto de trocar seu status de salvo por não-salvo e vice-versa). Mas deixemos essa questão menor para outra ocasião ou para nunca, e trabalhemos com os aspectos gerais da hipótese: a possibilidade de salvação e vida eterna. Dependendo da corrente dessa crença geral (chamada cristianismo, ou hipótese cristã) e do nível de fé do indivíduo, há a defesa de que as evidências do universo corroboram firmemente a hipótese cristã. Assim, o cristianismo não seria somente uma crença, mas uma maneira de ver o mundo (hipótese, modelo) que seria totalmente coerente com os indícios da vida real. Mais ainda: seria a hipótese mais adequada, a melhor para explicar todos os fatos do mundo. Descreverei neste parágrafo uma segunda hipótese, um segundo modelo para o mundo. Ela defende que a Bíblia foi inspirada por Deus (o personagem principal da Bíblia), um ser bom e muito poderoso. Segundo essa hipótese, Deus guiou a história da humanidade, é capaz de se comunicar com os humanos, seja em orações íntimas ou através de milagres, e tem o sincero desejo de salvar a humanidade do pecado. Contudo, o real comandante do universo é outro ser, chamado Diabo, que também aparece na Bíblia. Deus o descreve (através de suas influências) como um enganador, um mentiroso, e isso em parte é verdade. O Diabo é um troll, um verdadeiro troll, que gosta acima de tudo de enganar as pessoas por puro prazer. Ele gosta de ver outros seres enganados - Deus, por exemplo. E o Diabo é o ser mais poderoso do universo, podendo lograr seus intentos facilmente (e ainda contando com a ingenuidade de Deus). Assim, o Diabo deixa Deus usar seus limitados poderes para que consiga convencer a si mesmo e aos humanos que o seguem de que há vida eterna e salvação depois da vida terrena. Contudo, o que Deus ignora na sua inocência é que é o Diabo quem realmente está no controle do mundo, e o Diabo não permitirá que Deus execute seu plano de salvar seus protegidos. Em resumo, segundo a hipótese, a Bíblia e as experiências terrenas são completamente coerentes com a hipótese cristã justamente porque o Diabo quer enganar as pessoas, e para isso as faz acreditar cada vez mais na salvação através de mais e mais evidências inquestionáveis da veracidade da Bíblia, para que sejam completamente enganadas quando suas vidas findarem. Essa hipótese pode ser considerada completamente herética e absurda em alguns círculos. O que ela faz aqui? Eu a concebi como uma descrição alternativa do mundo para quem vê indícios de Deus em toda parte. Os mesmíssimos indícios que essas pessoas encontram corroboram a teoria alternativa, que apresenta os mesmos "sintomas" ao mundo mas tem um caráter diferente relativo à salvação. Assim, no entendimento do significado de tais indícios, escolher pela superpotência de Deus e pela vida eterna e rejeitar o Diabo e seu grande trote universal é uma questão puramente de costume, boa vontade e otimismo.

27 março, 2012

Mudanças de paradigma por frases de efeito

Às vezes a melhor maneira de anunciar que um paradigma (ou um modo de estudar o objeto, ou uma forma de ver as coisas) está errada é através de uma frase de efeito. Por exemplo, Martha Medeiros escreveu: "O tempo não cura tudo. Aliás, o tempo não cura nada, o tempo apenas tira o incurável do centro das atenções." Conseguiu deixar muito claro o que queria dizer.

Claro que tal facilidade é justamente o calcanhar de Aquiles das frases prontas; são imponentes mas facilmente enganam a razão. Tanto que elas não têm uma lógica consistente que permita falar em verdade, mentira, conseqüência. Por exemplo, dois ditos populares podem signficar justamente o contrário um da outro e parecerem razoáveis quando inseridos no lugar certo. Por exemplo, "o apressado come cru", mas "quem chega primeiro bebe a água limpa".

Exemplos também são enganadores. Sem exemplos. Se persistir o interesse, consulte o arquivo do blog.

a mulher que nada esquece

Existe uma mulher (chamada Jill Price) que consegue lembrar de todas as suas refeições e de algumas notícias em todos os dias da sua vida (após os 14 anos, parece). Ela anota regiamente essas informações em diários, mas é capaz de recuperá-las de cabeça.

Isso por si só é bem interessante. Outra coisa interessante é que certa vez uns cientistas fizeram um experimento com ela; pediram quais as roupas que estavam usando na primeira vez que falavam com ela. Jill foi simplesmente incapaz de lembrar, mostrando que sua memória parece ser seletiva; ela guarda muita informação, mas somente as que ela considera muito importante.

Observação: Espero ter lembrado bem de todas as coisas e não ter cometido nenhuma gafe.

tecnologia amish

Dizem que os amish rejeitam todos os tipos de tecnologia. Não é verdade; eles usam roupas, que é uma espécie de tecnologia, só não muito avançada.

por que não falo mal do Big Brother

São bem frequente nas redes sociais críticas ao programa Big Brother Brasil. As pessoas fazem isso porque vêem amigos do seu círculo ou grupo assistirem ou acompanharem o programa. Com isso, elas passam uma mensagem aos seus amigos, de que não gostam, e de que preferiam que eles não o vissem. Eu não falo mal do Big Brother; não preciso desaconselhar meus amigos a não assistir.

13 março, 2012

Uma explicação para a massa e para a constante de Planck

Acho que encontrei uma boa razão para o aparecimento da constante de Planck  nas equações da física, e uma outra razão para a massa.

A constante de Planck surge porque na equação de Schrödinger aparecem várias grandezas que podem ser medidas através de várias unidades. Precisamos da constante para igualar termos que de outra forma não poderiam ser iguais, como metros e segundos. (A constante é um número diferente conforme as unidades escolhidas. Afinal, uma coisa não pode ser igual ao mesmo número de metros e centímetros, a menos que este seja zero.) Assim, é natural que haja na equação de Schrödinger um termo destinado a cancelar grandezas de tempo, energia e extensão, e também é compreensível que se escreva como h em vez do número em determinada unidade.

A massa era um grande mistério para mim. Hoje a aceito bem melhor. Basta imaginar que as partículas (ou ondas, ou coisas) não satisfazem somente uma equação de Schrödinger, mas sim uma família a um parâmetro de equações, e este parâmetro é um número complexo que chamamos massa da partícula. É um número muito importante, e consequentemente aparece em outras equações ou expressões. Aliás, esse modo de ver as coisas nos faz aceitar que a massa possa ser negativa, nula ou complexa não real - é só uma outra equação que a partícula está satisfazendo.

27 fevereiro, 2012

o salário dos professores

Fiquei surpreso quando descobri que o governo pretende elevar o salário dos professores estaduais aqui no Rio Grande do Sul (e para variar, o "sindicado dos professores" reclamou, nem entendi direito). Já retorno à notícia.

Acho que um aumento instantâneo de salário mal ajudaria a educação. Continuaríamos com os mesmos professores, porém melhor pagos. Se quisermos realmente qualificar os professores, precisamos que a profissão seja uma escolha decente para os profissionais capazes, não só no salário como no ambiente de trabalho. Isso só se consegue com uma valorização contínua do exercício docente, deixando a carreira mais atraente. Aumentar o salário dos já professores pode até aumentar-lhes um pouco a moral e dar-lhes mais vontade para lecionar, mas só esse efeito me parece fraco.

A iniciativa do governo é dar aumentos progressivos aos professores até 2014. O chato é que a política pode ser interrompida, mas teve-se o bom senso de não se fazer planos para o próximo mandato (na verdade, depois disso, se não me engano, o aumento fica por conta de um índice dependente da inflação). Dessa forma, não há um grande revés repentino no orçamento e ao mesmo tempo prepara-se o terreno para que futuros professores abracem a carreira. O aumento foi muito bem não dado instantaneamente, para que o seu custo para o erário passe a valer quando mais o investimento trouxer os maiores benefícios, isto é, quando a carreira de professor passar a se tornar uma melhor opção no mercado.

26 fevereiro, 2012

sacolas plásticas

Penso que a proibição da distribuição das sacolas plásticas pelos supermercados não trará benefícios ao meio ambiente. Sacolas plásticas também são usadas para embrulhar o lixo, que é um uso que não pode ser evitado nem abreviado (você não pode reutilizá-las com esse fim). Se deixarem de dar sacolas nos supermercados, vamos ter que comprar sacolas igualmente para acondicionar nosso lixo, não diminuindo o plástico necessário à civilização.

Assim, quando usamos as sacolas para carregar as compras (mesmo que só uma vez), estamos usando ela por uma segunda vez (não cronologicamente), já que também serão usadas para embalar o lixo. Se tivermos que comprar uma sacola, por mais sustentável que ela seja, ela estão sendo comprada (ou consumida) para fazer algo que já era possível fazer antes, sem gastar nem produzir nenhuma sacola.

Acho razoável quando o supermercado dá desconto se você traz a própria sacola de casa. Isso é equivalente ao supermercado cobrar pelas sacolas, o que acontecia, só que antes você era obrigado a pagar pelas sacolas (preço embutido nos produtos, óbvio, assim como o preço da manutenção do supermercado). Acho essa opcionalidade um avanço. E penso que dar desconto, ao menos por enquanto, pelas sacolas pode até ser melhor, para evitar que alguém fique sem dinheiro suficiente para pagar as sacolas plásticas cobradas separadamente por causa de um erro de cálculo. Se o sistema se tornar mais comum, talvez seja melhor fazer o mais lógico: cobrar pelas sacolas também.

25 fevereiro, 2012

confusões sobre direito

Alguns advogados alegam que o réu não é obrigado a produzir prova contra si mesmo, e portanto não pode ser obrigado a fazer o teste do bafômetro. Eu acho esse argumento realmente estranho.

Pensemos bem. Lembremos que dirigir alcoolizado é crime. Se um motorista nega que está bêbado, como vai recusar fazer o teste do bafômetro alegando que não é obrigado a produzir prova contra si mesmo? Porque, se disser isso, estará dizendo que o bafômetro indicaria que ele está bêbado, produzindo uma prova. Assim, ele está declarando que está bêbado, pois afirma que o teste do bafômetro produziria uma prova.

Em alguns casos, testemunhas fazem a identificação do criminoso, olhando uma série de suspeitos (ou pessoas representando suspeitos) e indicando qual deles foi visto cometendo o delito. Então o réu teria direito também a não mostrar-se, para não incriminar a si mesmo?

Entendo que o réu tenha o direito de permanecer calado, de que a lei não o obrigue a falar. Mas penso que tal silêncio pode ser usado contra ele também. Se lhe dirigem uma pergunta na qual lhe é dada a chance de fornecer um álibi e atestar sua inocência, e ele se cala, seu silêncio pode ser interpretado contra ele. Ou seu advogado vai alegar que seu cliente tinha uma boa explicação para onde estava naquela noite, mas por uma espécie de masoquismo não quer provar de uma vez por todas sua inocência porque quer curtir o processo até o fim?

Outra história que não consigo entender é sobre o direito de mentir do réu. O que isso significa? Um cidadão pode mentir sem que se configure crime, embora tipos específicos de mentira (calúnia, falsidade ideológica) possam ser enquadrados como tal. Daí não entendo. O réu tem o direito de mentir como um cidadão comum, ou pode inclusive mentir de mais formas? O que significa ter o direito de mentir? Significa que ele não pode ser imputado por forjar álibis que depois se revelem falsos? E o tal direito a ampla defesa, permite ao acusado se passar por outra pessoa para criar um álibi? Isso é muito confuso. Testemunhas prometem não mentir. O réu não é obrigado a falar, mas se falar, não vejo uma boa razão (do ponto de vista de apuração da verdade) para que possa mentir. Ele pode mentir, mas, descoberta a mentira, pode ser confrontado com a afirmação mentirosa pela acusação (não sei se é assim). Existe um outro conceito que é a obstrução da justiça. Parece-me que o réu que prefira não colaborar com as investigações, mesmo com seu silêncio, está, de certo modo, obstruindo a justiça.

Acho que entendo o que é presunção de inocência, prisões preventivas à parte. Entendo que o réu não é considerado culpado enquanto houver recurso (enfim ele não pode ser imputado por haver um processo contra ele), e acho bem razoável. Por isso estranho muito a Lei da Ficha Limpa, recentemente aprovada e declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Ela proíbe a candidatura de sujeitos condenados em segunda instância ou tribunal superior, mesmo que ainda caiba recurso e o sujeito possa ser considerado inocente no fim das contas. Pergunto-me porque não estabelecem como condição que o processo tenha ido até o fim (transitado em julgado).

Às vezes penso que esses assuntos são propositalmente confusos só para que tenhamos que pagar advogados! (Provavelmente não são. Acho que isso acontece porque é impossível axiomatizar tudo.)

sobre a escolha da sexualidade

Dias atrás li sobre uma mulher famosa causando polêmica nas comunidades GLBTXYZ dizendo que sexualidade para ela era uma questão de escolha, que ela podia ser hétero ou homo conforme sua vontade.

Penso que essa moça não entendeu direito uma coisa. Uma pessoa que pode transitar assim pelos dois lados da rua é bissexual, e isso não é uma escolha dela. Quem não pode escolher também não tem escolha. Sendo assim, sexualidade não é questão de escolha. Claro que podemos escolher ter uma experiência, mas não podemos anular um desejo por vontade. Se com você é diferente, comente, mas não como a tal mulher famosa.

(O espectro de sexualidades é mais largo que homo/hetero/bi, com homens preferencialmente homossexuais mas que conseguem ter filhos da maneira tradicional e algumas nuances como pedofilia.)

31 janeiro, 2012

Enganos sobre ateísmo


Primeiramente, ateísmo não é a negação propositiva de um deus. Descobri uma analogia (de minha autoria) que pode ajudar muitas pessoas a entenderem o que quero dizer quando sou ateu ou que não acredito em deuses. Eu não acredito que pessoas tenham tido contato com extraterrestres (em especial, nenhuma abdução nem discos voadores). Acho os depoimentos fracos e confusos, as fotos toscas, os materiais extraterrestres sempre faltantes. Enfim, as pessoas acreditarem porque têm necessidade ou vontade me parece bem mais provável do que os acontecimentos que elas alegam. Assim, se existisse tal expressão, eu seria um ateu dos extraterrestres. E isso não significa que eu nego veementemente o contato entre terrestres e extraterrestres, mas sim que não tenho razão para reverter minha posição. Acho que uma boa frase que sintetiza esse pensamento é a frase [perdoem-me por não encontrar o link] da Åsa Heuser sobre religião: "Não me convence". Esta é a minha posição sobre a ressureição de Jesus e sobre a abdução de pessoas: não me convencem. Outra referência adequada seria este post do Eli Vieira.

Há uma diferença óbvia: há supostas "provas lógicas" de deus (mesmo que falsas), que são consequências de raciocínio e não de observações empíricas, mas todas evidência de extraterrestres é empírica (mesmo que falsas). Por exemplo, sobre a existência necessária da primeira causa, ou do primeiro motor. Também rejeito estas provas - não por orgulho, teimosia ou escolha; elas simplesmente não me convencem. O raciocínio, penso, é humano e portanto também pode ser falho (tem um mundo inteiro nesta frase). O meu exemplo preferido (uso a título de ilustração para as pessoas entenderem meu ponto, não para convencê-las, embora indiretamente ajuda) é sobre a impossibilidade de vôo para máquinas mais pesadas que o ar. É lógico que a hereditariedade não pode criar informação genética, e é lógico que máquinas mais pesadas que o ar não podem voar. Também é lógico que o mundo teve um começo, e também é lógico que ele não pode ter começado do nada.

Às vezes me pedem para provar que deuses não existem (curiosamente, geralmente pedem por um em particular). A verdade é que não sei se deuses existem, e não sei se poderemos ter certeza disso em algum dia. Por exemplo, eu sou incapaz de mostrar a inexistência de Papai Noel. Não que eu rejeite ou negue o Papai Noel; somente não me convence. Acho que os brinquedos que eu ganhava têm uma melhor explicação. Mesmo que eu veja o Papai Noel sendo usado para enganar pessoas, e que haja uma explicação histórica para o surgimento de tal ser mitológico, não posso provar que ele não passa de uma fantasia. E não vou tentar provar a inexistência de deuses antes de provar a inexistência de Papai Noel. Mesmo quando usamos atributos como onipotente, onipresente e onisciente para definir o deus da Bíblia (Deus pelos fiéis) não podemos provar sua impossibilidade; sempre pode ser que estejamos fazendo algo errado.

Penso que ateísmo somente seja simplesmente não crer em deuses pessoais. Até então eu não havia feito tal distinção, mas existem pessoas que vêem um deus completamente desligado dos problemas emocionais humanos. Dependendo do caso ele cria o universo e depois desaparece (deísmo), ou ele é a beleza da natureza e a ordem do universo (teísmo de Spinoza). Para mim o ateísmo não fala sobre essas coisas. Acho simplesmente irrelevante para minha visão de mundo, assim como (outra ilustração!) o solipsismo. (Estou abreviando um pouco a história. Afinal, sou um ser pensante que sabe estruturar um raciocínio em vez de simplesmente vomitar seu saber.)

Um engano muito comum sobre ateísmo é a respeito da ciência. Ateísmo não fala sobre ciência; é simplesmente a ausência de crença em deuses (pessoais). E ponto. É possível ser um cientista ou um amante da ciência sem ser ateu. Também é possível ser ateu e não dar a mínima para esses assuntos, e mesmo ser "contra a ciência". Claro que algumas fatos científicos são bem estabelecidos e difíceis de combater, mas ateus são indivíduos, e não há nada de contraditório em ser ateu e defender a planicidade do planeta.

O ateísta não é obrigado a formular uma explicação científica para os elementos do universo, nem defender que os eventos do mundo natural sejam investigados cientificamente; ele simplesmente não acredita em deuses. Ateísmo não é uma explicação para o universo e para a vida; é simplesmente a ausência de crença em deuses. Por que é necessário associar uma coisa à outra?

Eu pessoalmente acredito que o método que chamamos ciência (sem entrar em maiores detalhes sobre o que é ciência) tem nos dado bons resultados, tanto em tecnologias úteis como em conhecimentos confiáveis. (Não vou discutir porque ciência funciona.) Posso frasear: eu (junto como as agências de fomento) confio na ciência e no trabalho dos cientistas, não por serem perfeitos, mas por valerem a pena. Esta não é uma crença nem um ato de fé, ao contrário do que alguns partorzinhos pretendem (projeção freudiana, na minha opinião). De qualquer maneira, ateísmo não significa necessariamente confiar na ciência, embora muitos ateus (e muitos não ateus) concordem que ela é o melhor intrumento para investigar o mundo natural. A ciência não é perfeita, mas como diz aquela camiseta... it works, bitches.

Faço questão de entrar num particular: a relação com o evolucionismo. Ocorre simplesmente que a teoria evolucionista (incluindo aqui a genética, a seleção natural e a ascendência comum) é uma explicação para a vida como conhecemos, explicando coerentemente (e cientificamente) várias semelhanças e diferenças entre os seres vivos. Muitas pessoas, atéias ou não, são evolucionistas. A diferença é que algumas religiões têm conflitos com essa teoria, enquanto o ateísmo é completamente neutro. A princípio é possível ser ateu e não saber por que a vida é assim, ou ter uma visão diferente. Hoje é meio raro acontecer, mas muito antes de Darwin a ideia de mutabilidade dos seres vivos e de evolução via seleção natural era desconhecida, e um ateu não teria uma resposta convincente como a que temos hoje. Nem por isso sua situação como ateísta seria diferente. Faço questão de frisar: ateísta não tem que ser evolucionista, nem defender o evolucionismo como forma de suportar seu ateísmo. Apesar da relação estatística (não tenho dados aqui, mas creio haver uma correlação positiva entre ateístas e evolucionistas), não há uma relação lógica.

Também o ateísmo não afirma que o universo surgiu do nada (como sempre acusam). Afinal, o ateísmo é simplesmente... você sabe o que. É normal interessar-se por essas questões, como por que existe alguma coisa quando poderia não existir nada, mas muitas vezes não há resposta decente. Ateístas são provocados a darem suas respostas sobre essas perguntas como se o ateísmo devesse dar uma resposta. Pessoalmente, prefiro admitir que não sei a dar uma resposta errada, como penso serem as respostas das religiões. O ateísmo não afirma nada sobre o universo. Um ateu é um indivíduo e pode responder como que quiser, inclusive admitir que não sabe. O ponto é que ele não vai sair pela tangente dizendo "Ah, foi deus que criou". Ateísmo não contém uma explicação para as coisas serem como são, ele é simplesmente... você sabe o que. Alguns religiosos não conseguem separar as coisas; acham que o ateu sempre fala em nome dos supostos princípios do ateísmo, ou da aludida visão de mundo ateísta. A verdade é que o ateísmo é vazio de proposições. Mesmo a inexistência de um deus pessoal não é um dogma; é só parte da definição de ateísmo. Ateísmo é só um nome, não é uma filosofia muito menos uma religião. É que nem a descrença em discos voadores avistados e abduções - só que com um nome curtíssimo.

Chegando ao campo da moral, ateus às vezes são acusados de serem imorais, ou de adotarem o ponto de vista do relativismo cultural. A verdade é que ateísmo não fala sobre moral. Ateus agem da forma que acharem melhor, assim como todas as pessoas, só que sua posição sobre religião não dita absolutamente nada, enquanto para um religioso pode interferir. Para mim o problema da existência de uma moral ou ética universal pertence à filosofia, e é super delicado para ter uma resposta tão simples (assim como a existência do universo, da vida, da consciência...). Não quero ter uma resposta simples e errada (como as que as religões oferecem) sobre esses assuntos.

Discussão menos polêmica é sobre os bebês serem considerados ateus ou não. Para mim não importa muito; é só o jeito de usar a palavra. Pode-se discutir e dar argumentos pelos dois lados, mas não tratarei disso aqui. De qualquer maneira, vou considerar que bebês não são ateus por não terem opinião formada sobre o assunto.

Por muito tempo considerei que só deveria ser considerado ateu quem também não acreditasse em coisas como astrologia, cura por cristais e pseudociências em geral. Hoje já não vejo mais motivos. Acho que para ser considerado ateu basta não acreditar em deuses pessoais (e ter o discernimento para isso). Para mim superstições e crendices (num sentido que excluem as religiões) são pura bobagem, mas acho que ser ateu é outra coisa, e que é possível ser ateu e supersticioso sem ser contraditório.

Em resumo: ateísmo não é uma afirmação propositiva da inexistência de deuses pessoais. O ateu não vê evidência de deuses, e não precisa provar a inexistência para sustentar sua posição de ateu. Ateísmo não fala sobre ciência, moral ou superstições.